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21-05-2002 -
Noticia |
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Segurança 02 - O
Motociclista |
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Nas andaduras de moto
tudo é importante: o Homem (ou a Mulher), a
máquina, as condições, tudo. Qualquer falha por
parte de um componente e o resultado é quase
sempre o mesmo: acidente. Parece demasiado
complicado? É que é mesmo. Mas entrando-se na
rotina do pensamento seguro, interiorizando a
lógica da segurança como valor principal, deixa
de ser complicado passando a fluir com
naturalidade.
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Até porque, por outro
lado, é bastante simples – tudo decorre da
utilização constante do bom senso. Por isso, sem
ordem de precedências, dentre os milhentos
aspectos a ter em conta, existe um de minha
predilecção – o motociclista. É o ser humano
que, em última análise leva nas mãos o seu
destino. Daí que ele deva estar em boas
condições psíquicas e físicas bem como ainda,
suficientemente protegido. O corpinho deverá
estar em razoável estado de conservação. Não é
necessário ser o Schwarzeneger mas convenhamos
que um gordo adiposo, com aquela banha toda a
bater e a escorregar para os lados, terá
dificuldade em segurar a sua “menina” numa
situação mais apertada. Daí que um tónus
muscular médio seja requisito. Um exercício
físico não mata ninguém e abre maiores
possibilidades de gozo na condução (aquela
curvinha a roçar com o deslizador no próximo
Track Day, por ex., um bucha não faz). Por outro
lado, o raciocínio deve estar claro. E existe,
como sabeis, uma ligação directa do estômago à
cabeça. É certo que todos, em maior ou menor
grau gostamos de comer, beber e folgar (ele é
munta concentração, munta febra, munta
bejeca...) e eu até sei de alguns etilizados
profissionais, armados em heróis, que têm
conseguido chegar a casa sem novidade, mas
também sei de outros que já morreram ou, se
calhar pior, foram gozar os ares de Alcoitão e
já não andam de mota. E nunca mais vão andar! Já
imaginaram? Mais 40 ou 50 anos de vida e nada de
mota? Então para quê facilitar? Para dar a tal
curvinha bem baldada, a afiar o pisa no asfalto,
o espírito tem que estar claro e alerta e a
visão cristalina. Nada de feijoadas regadas com
Cartaxo, nem noites mal dormidas antes da
viagem, por pequena que seja. Depois do lauto
repasto, nada de estrada... sesta, ou passeio a
pé para desmoer. É fundamental – cabecinha
fresca e descansada e estômago levezinho. E
olhem que eu detesto água às refeições. Mas se
não estivermos em condições na hora do regresso,
paciência! Ficamos. O tempo que for preciso. Que
para ir para a quinta das tabuletas é que não
devemos ter tempo!
Agora que
estamos numa de mens sana in corpore sano, vamos
andar de mota. Not so fast... Pensemos no
corpinho. E ao pensarmos nele haverá alguma
parte dele que não nos faça falta e possamos
prescindir? A cabeça, um braço, um pulso, um
joelho, um artelho, um dedo que seja? Pensem
nisso, na quantidade de componentes desta
máquina que é o corpo e enumerem aqueles que não
são necessários para andar de moto. Encontraram
algum? Então se não encontraram nenhum e se
sabem que a possibilidade de uma qualquer queda
é grande (porque é!) porque diacho não protegem
esses componentes? É absurda a quantidade de
gente que vemos na rua, a andar de moto e sem
protecção corporal. Ou então com protecção
parcial. O exemplo clássico é o do “motard” que
gastou dinheiro a comprar a mota, gastou
dinheiro num blusão que faça vista, começou a
poupar no capacete e desatou a poupar no resto.
Isso é mais ou menos o mesmo que dizer, gosto do
meu tronco, a cabeça que se aguente, o resto...
dispenso. Dispensa pés, dispensa joelhos,
dispensa mãos e dedos?
A regra de ouro,
segundo os especialistas, é “vista-se para a
queda” – literalmente. Não há que escamotear a
possibilidade de irmos ao tapete. Isto é como
marcar penalties, só não falha quem os não
marca. Quem anda de moto vive com a realidade de
poder ir chamar o alcatrão por tu. E quando isso
suceder ( e pode suceder a qualquer momento, na
deslocação mais curta ) estará o nosso corpo
protegido ? Provavelmente não. É que calças de
ganga, senhores, é para rir. Atentem apenas no
seguinte: uma calça de ganga numa queda de moto
a cerca de 80km/h aguenta 1,20 metros ( ??? )
antes de rasgar e expor aquela nossa pelezinha
macia que, obviamente não vai durar muitos
centímetros até expor a carniça por baixo que,
por sua vez se gastará até ao osso. E sabem que
mais? A carne perdida no asfalto não volta a
crescer. Kevlar, por sua vez, já aguenta 5,5
metros. E sabem quanto aguenta o cabedal? 26
metros! (dados da Cycle magazine, Set 1988) O
que é que vamos pois vestir? Cabedal, então.
Cabedal para as pernas e cabedal para o tronco.
Cabedal também para as mãos e cabedal para os
pés. Em última análise é realmente o mais
confortável e não é tão calorento como se possa
pensar, especialmente em trânsito.
A
ideia que queremos deixar é esta. Corpo só temos
este e peças sobresselentes não há, pelo menos
com a qualidade das originais. Por isso, quando
toca a proteger essa máquina soberba e frágil
não é aí que devemos poupar. Devemos comprar o
melhor que o nosso dinheiro consiga. Não estou a
falar do equipamento mais caro por ser da marca
da moda, estou a falar de qualidade real, embora
deva admitir que as boas marcas tendam a ter
bons produtos.
Portanto toca
de comprar um capacete de boa qualidade (só
posso recomendar modelos fechados – já viram o
que é deixar metade da cara no asfalto? fica
feio depois), o mais leve possível (alivia muito
o esforço do pescoço), com bom índice de
penetração (diminui o ruído do vento), com boas
e variadas entradas e saídas de ar (bem arejado
para não sofrer demasiado com o calor e não
ficar careca mais cedo). Ao experimentar um
capacete novo ele deverá ficar suficientemente
justo para não desandar para lado nenhum com os
movimentos da cabeça. Se for um niquinho
incomodativo por apertar um bocadinho as
bochechas não faz mal nenhum. Muito em breve os
materiais darão de si e se farão à cabeça,
confortavelmente. A protecção dos olhos em
relação à luz e ao vento também é uma prioridade
e aqui as opções são entre viseira escura (só
para durante o dia) e a utilização de óculos. Se
optarem por estes cuidado ao material das
lentes. Vidro quebra e entra pelos olhos dentro.
E toca a comprar um fato ou um conjunto
de duas peças em cabedal. Cabedal grosso,
apropriado para motociclistas, nada de cabedal
fininho estilo antílope. As peças devem estar
justas, para não adejar ao vento e prejudicar a
condução, mas também devem ter a folga
suficiente para uma camada de roupa de inverno
(uns collants e uma camisola de gola alta por
ex.). Se forem duas convém disporem de fecho de
correr de união entre ambas. Se não dispuserem
de protecções rígidas para os cotovelos, ombros,
coluna e joelhos é possível comprar essas peças
avulso, o que recomendo. É certo que, para quem
usa a mota no trabalho e tem de andar de fato e
gravata e não pode ir de cabedal para o emprego
toda esta conversa vai parecer de loucos mas,
asseguro-vos, não é. Afloraremos esse aspecto
noutro texto onde abordaremos também outros
materiais.
Como também não vamos
descurar a protecção do pé e do tornozelo o que
se impõe será uma bota de cano alto e sem salto.
Botas à cow-boy são muito lindas para os filmes
mas não oferecem boa aderência ao solo nem
estabilidade. Todo o tipo de ténis, alpercata e
calçado ligeiro tende a saltar durante o
acidente.
Nas mãos, sempre mas sempre,
luvas. Cabedal de preferência e com os dedos
inteiros. Luvas sem dedos podem dar uma imagem
muito in mas você vai sentir-se mal se os seus
dedos estiverem out por terem ido na gravilha.
Tudo isto é
muito quente e desconfortável, especialmente no
nosso verão? Talvez, mas cada vez que penso em
dispensar uma destas peças faço a pergunta a mim
próprio: se o acidente acontecer, estás disposto
a assumir o risco de uma mão, um pé, um joelho,
aleijados? Raramente estou.
Vamos
esclarecer definitivamente uma questão. Andar de
mota é um acto de elevado risco, só por si, e há
apenas duas maneiras de o fazer – consciente ou
inconscientemente. Para andar inconscientemente
não é preciso nada. Basta saltar para cima dela,
chinelo no pé, calção de banho e T-shirt,
capacete a fazer de boné, po-la a rolar e o
destino leva-nos... seja para o local que
escolhemos seja para outro (o controle não é
nosso). Andar conscientemente implica esforço,
concentração, maçadas, gastos de tempo e
dinheiro maiores e até algum sofrimento físico.
Porém o controle de grande parte da situação é
nosso e esse facto, só por si, implica uma
redução drástica da percentagem do risco. Até
pode ser que o inconsciente dure mais que o
consciente (ao menino e ao borracho põe Deus a
mão por baixo) mas isso é puro acto do destino
em que o consciente teve nitidamente azar ou
cometeu um erro. É a excepção... que confirma a
regra. O consciente reduziu a percentagem do seu
risco de andar de moto e faz parte do grupo que
tem esperança de vida. Para reduzir ainda mais o
risco de que falamos só mesmo deixando de andar
de moto. Mas isso não é opção, pois não?
Jorge
Macieira
Advogado, Mediador de Conflitos e motociclista
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